Promoção da agrobiodiversidade e da restauração ribeirinha na bacia do rio binacional Sixaola

Solução completa
A Sra. Daisy moendo sementes de cacau na comunidade de Yorkin
IUCN, Mónica Quesada

As comunidades da bacia do rio Sixaola (2.848 km2), compartilhada entre a Costa Rica e o Panamá, são mestiças e indígenas, com altos índices de pobreza e vulnerabilidade. A área apresenta uma incidência crescente de eventos climáticos extremos, especialmente secas, altas temperaturas e inundações, que colocam em risco os meios de subsistência locais. Propõe-se uma solução abrangente para aumentar a resiliência socioambiental que consiste na combinação de diálogo, capacidades, conhecimento, alianças e trabalho de campo para promover a agrobiodiversidade e reflorestar a bacia. Com produtores de sete comunidades, capacitação local e coordenação interinstitucional, as medidas de EBA são implementadas, seu impacto na segurança alimentar é monitorado e a cooperação transfronteiriça é facilitada. A AbE é promovida por meio de processos de "aprendizado de ação" que visam melhorar e diversificar as práticas produtivas, resgatar o uso de sementes autóctones e restaurar as florestas ribeirinhas por meio de ações binacionais.

Última atualização: 21 Feb 2023
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Contexto
Desafios enfrentados
Seca
Chuvas irregulares
Enchentes
Degradação de terras e florestas
Perda de biodiversidade
Mudanças no contexto sociocultural
Falta de segurança alimentar
  • A fragmentação do habitat, as chuvas fortes e as práticas agrícolas inadequadas aumentam a erosão do solo, a sedimentação e a obstrução dos cursos d'água, prejudicando os meios de subsistência locais.
  • As ameaças climáticas, como secas, inundações e chuvas extremas que reduzem a qualidade da água e afetam a produção, estão aumentando.
  • Na bacia média e inferior, a população é altamente dependente da agricultura e enfrenta insegurança alimentar devido a perdas de safra e à degradação dos agroecossistemas.
  • Há uma preocupação crescente com a perda da diversidade genética e do conhecimento tradicional na agricultura com espécies nativas.
  • A área apresenta alta vulnerabilidade socioeconômica e marginalização (por exemplo, falta de oportunidades econômicas e altos níveis de pobreza).
  • A capacidade de gestão dos municípios e dos governos locais indígenas é baixa e requer maior coordenação intersetorial e com o governo central.
Escala de implementação
Local
Subnacional
Multinacional
Ecossistemas
Agrofloresta
Floresta tropical perene
Rio, córrego
Tema
Adaptação
Serviços de ecossistema
Restauração
Segurança alimentar
Meios de subsistência sustentáveis
Povos indígenas
Atores locais
Ciência e pesquisa
Cultura
Diversidade genética
Conhecimento tradicional
Agricultura
Prevenção de erosão
Gerenciamento de bacias hidrográficas
Conectividade/conservação transfronteiriça
Localização
Talamanca, Limón, Costa Rica
América Central
Processar
Resumo do processo

A solução integra três blocos de construção (BB): 1. "Aprendizado de ação", 2. propriedade comunitária de medidas de adaptação e 3. Ampliação, a fim de melhorar a segurança alimentar e hídrica em 7 comunidades locais de uma bacia hidrográfica compartilhada. O BB1 é transversal, pois o desenvolvimento de capacidade e a troca de experiências dizem respeito e alimentam todos os BBs, especialmente quando realizados por meio de uma abordagem de "aprender fazendo". A implementação de medidas de AbE em nível de fazendas e paisagens florestais (BB2) fez parte desse processo de aprendizado e permitiu o aumento da resiliência dos ecossistemas locais e dos meios de subsistência, alcançando - em ambos os lados da fronteira - melhorias nas matas ciliares, diversificação produtiva e recuperação de sementes crioulas (nativas). O BB2 também forneceu um canal para valorizar o conhecimento tradicional e promover a AbE em diferentes níveis de governança, usando experiências de campo para enriquecer a gestão de bacias hidrográficas e fundamentar a ampliação da AbE (BB3). Assim, por meio de ações de AbE e de governança, foi possível equilibrar os benefícios imediatos para as comunidades para enfrentar os desafios diários, com uma visão de toda a bacia que, a médio/longo prazo, consolida o capital social e as capacidades locais de tomada de decisão.

Blocos de construção
Aprendizado de ação" e monitoramento para aumentar as capacidades e o conhecimento

Além de treinar e apoiar as comunidades na implementação de medidas de AbE por meio de suas práticas produtivas, o objetivo é gerar evidências sobre os benefícios dessas medidas e criar condições para sua sustentabilidade e aumento de escala.

  • A vulnerabilidade socioambiental de 7 comunidades na bacia do rio Sixaola é examinada para, em seguida, identificar e priorizar as medidas de AbE.
  • São feitos diagnósticos (produtivo, socioeconômico e agroecológico) para identificar famílias comprometidas com a transformação de suas propriedades e selecionar aquelas com maior potencial para se tornarem propriedades integrais.
  • É fornecido apoio técnico às comunidades, complementado com o conhecimento tradicional, para garantir que as medidas de AbE contribuam para a segurança alimentar e hídrica.
  • São organizados intercâmbios e treinamentos para produtores (homens e mulheres), autoridades indígenas, jovens e municípios sobre mudanças climáticas, segurança alimentar, gestão de recursos naturais, fertilizantes orgânicos e conservação do solo.
  • O monitoramento e a avaliação são realizados para compreender os benefícios das medidas de EBA e informar a ampliação horizontal e vertical.
  • As atividades, como a Feira de Agrobiodiversidade e os eventos de reflorestamento binacional, são realizadas de forma colaborativa com os atores locais.
Fatores facilitadores
  • Os anos de trabalho anterior da IUCN e da ACBTC com as comunidades locais foram um fator essencial para garantir processos de participação eficazes e inclusivos, alcançar um alto nível de propriedade das medidas de EBA e capacitar as partes interessadas (nesse caso, produtores, grupos comunitários, municípios e ministérios).
  • O acordo binacional entre a Costa Rica e o Panamá (de 1979 e renovado em 1995) facilita o trabalho em nível binacional e a coordenação intersetorial, e endossa a Comissão Binacional para Sixaola, que funciona desde 2011.
Lição aprendida
  • O autodiagnóstico das vulnerabilidades em face das mudanças climáticas (nesse caso, por meio da metodologia CRiSTAL) é uma ferramenta poderosa que permite que as comunidades priorizem conjuntamente o que é mais urgente e importante e alcancem maiores benefícios coletivos.
  • A aplicação da abordagem de "aprendizado de ação" em nível comunitário permite uma melhor compreensão de vários conceitos relacionados à AbE e cria uma comunidade de prática que valoriza e se apropria das medidas de adaptação.
  • É importante reconhecer a complementaridade entre o conhecimento científico e o tradicional para a implementação das medidas de AbE.
Propriedade comunitária de medidas de adaptação baseadas em ecossistemas e biodiversidade

As comunidades se apropriaram das seguintes medidas de EbA, uma vez priorizadas e implementadas de forma participativa na bacia:

  1. Restauração de matas ciliares. São realizados eventos de reflorestamento binacional envolvendo comunidades e escolas locais. Esses esforços reduzem a erosão, atenuam o risco de enchentes e reforçam a cooperação transfronteiriça e o empoderamento local, inclusive dos jovens. A sustentabilidade dessa ação está integrada em uma estratégia de reflorestamento para a bacia do meio.
  2. Fazendas integrais/sistemas agroflorestais. As práticas são incorporadas para gerenciar os serviços do ecossistema e gerar uma alta diversidade de produtos (agrícolas, florestais e energéticos). São promovidas práticas de conservação do solo e uma transição para sistemas agroflorestais com diversificação de culturas e árvores, pomares tropicais, semeadura de grãos básicos e bancos de proteínas.
  3. Recuperação e valorização de sementes e variedades autóctones. São organizadas Feiras de Agrobiodiversidade para promover a conservação da diversidade genética( sementescrioulas ) e seu conhecimento tradicional. O impacto atribuído à Feira pode ser visto nos aumentos de: participação (expositores), diversidade de espécies (> 220) e oferta de produtos com valor agregado.
Fatores facilitadores
  • A Feira da Agrobiodiversidade nasceu da necessidade, identificada pelas comunidades, de destacar a importância da diversidade genética para os meios de subsistência e adaptação locais.
  • Desde sua primeira organização, em 2012, a Feira vem ganhando notoriedade e se consolidando, com o envolvimento de cada vez mais instituições (associações indígenas; municípios; instituições governamentais, como ministérios, institutos de desenvolvimento rural, de aprendizagem ou de pesquisa agrícola; universidades; e o CBCRS) e visitantes.
Lição aprendida
  • A sabedoria local relacionada à variabilidade climática e aos eventos extremos vem do conhecimento tradicional sobre resiliência e adaptação e é um ingrediente fundamental para a criação de respostas comunitárias às mudanças climáticas.
  • O trabalho com as famílias foi um modelo eficaz, assim como a promoção de 9 fazendas integrais demonstrativas (replicadas em 31 novas fazendas). A fazenda integral produz uma grande diversidade de produtos (agrícolas, florestais e energéticos) e otimiza o gerenciamento dos recursos naturais. Se for enquadrado em nível de paisagem, esse modelo de produção consolida a abordagem EbA e facilita seu aumento de escala.
  • A Feira da Agrobiodiversidade acabou sendo um espaço valioso para os produtores; lá eles podem criar contatos diretos para trocar experiências, informações e material genético, e por isso há um número crescente de expositores provenientes de um número cada vez maior de comunidades.
  • O nível de compromisso institucional observado nas organizações envolvidas dá importância à conservação e ao resgate de sementes nativas e sua relação com a adaptação.
Aumento de escala e sustentabilidade das medidas de adaptação

A promoção de medidas de AbE com um alto nível de envolvimento da comunidade e laços binacionais foi uma maneira eficaz de obter maior interação entre os atores comunitários, municipais e nacionais, e também entre os pares (rede de produtores resilientes; encontro do governo local). Os resultados são, por um lado, maior capacitação local e, por outro, aumento de escala das medidas de AbE tanto vertical quanto horizontalmente. Assim, são feitas contribuições para institucionalizar a AbE e criar condições para sua sustentabilidade. A replicação do modelo de fazenda integral surgiu do trabalho em rede entre produtores, comunidades e governos locais, e de um projeto regional com a Comissão Binacional da Bacia do Rio Sixaola (CBCRS), que forneceu o financiamento. A Feira da Agrobiodiversidade, o trabalho dos produtores como uma rede e os Eventos de Reflorestamento Binacional, que agora estão sob os auspícios de instituições locais e nacionais, foram importantes forças mobilizadoras de mudança e espaços de intercâmbio e aprendizado. No sentido vertical, a ampliação da AbE incluiu o trabalho com o CBCRS para integrar a AbE no Plano Estratégico de Desenvolvimento Territorial Transfronteiriço (2017-2021) e com o MINAE na Política Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas da Costa Rica.

Fatores facilitadores
  • Grande parte do trabalho foi realizada graças ao papel de canalização e orientação do CBCRS (criado em 2009) como plataforma binacional de governança e diálogo, e da ACBTC como associação de desenvolvimento local. Ambos defendem os interesses locais e territoriais e conhecem as lacunas e necessidades existentes na área e, com esse projeto, conseguiram abordar os desafios que as comunidades enfrentam e melhorar a governança na bacia, promovendo uma abordagem ecossistêmica e uma ampla participação dos atores.
Lição aprendida
  • A coordenação de esforços por meio do CBCRS mostrou que é mais econômico trabalhar com as estruturas e os órgãos de governança existentes, com poderes e interesses na boa gestão dos recursos naturais e na obtenção de uma representação adequada dos principais atores, do que tentar criar novos grupos ou comitês para lidar com as questões de EBA.
  • Melhorar a governança multinível e multissetorial é uma parte fundamental da adaptação eficaz. Aqui, a função dos governos subnacionais (como os municípios) precisa ser ressaltada, já que eles têm um mandato na gestão do território, mas também responsabilidades na implementação de políticas e programas nacionais de adaptação (por exemplo, NDCs e NAPs).
  • A identificação de porta-vozes e líderes (entre homens, mulheres e jovens) é um fator importante para fomentar efetivamente a adoção e a ampliação da AbE.
Impactos
  • O sistema de fazenda integral foi implementado, e posteriormente replicado, para aumentar o fornecimento de alimentos, a formação do solo e o controle da erosão.
  • Aumento das capacidades de: 40 agricultores que implementam fazendas integrais e sistemas agroflorestais, 20 jovens treinados em mudanças climáticas que lideram projetos em suas comunidades, 3 municípios e > 200 pessoas treinadas em EbA, governança para adaptação e gerenciamento de água.
  • Aumento do diálogo, do intercâmbio, da conscientização e da valorização da biodiversidade graças à Feira de Agrobiodiversidade anual (> 1.000 pessoas) com troca de sementes nativas entre > 100 agricultores desde 2015.
  • 7.500 árvores nativas plantadas em eventos anuais de reflorestamento binacional para recuperar as florestas das margens dos rios.
  • Evidências sobre os benefícios da EBA para a segurança alimentar, aplicando uma metodologia de monitoramento e avaliação em 9 fazendas integradas.
  • Capital social fortalecido, com comunidades e produtores mais bem organizados e informados.
  • Compromissos assumidos por entidades interinstitucionais para dar sustentabilidade às ações.
  • Ampliação das ações de AbE e das lições aprendidas por meio de uma rede de produtores resilientes (40 fazendas), da Comissão Binacional da Bacia do Rio Sixaola e das entidades responsáveis pelas políticas de mudanças climáticas em vários níveis de governo.
Beneficiários
  • 7 comunidades (~400 pessoas), incluindo indígenas de Bri Bri e Cabécar: Yorkín, Shuabb, Catarina, Paraíso (Costa Rica). El Guabo, Washout, Barranco (Panamá)
  • Comissão Binacional Sixaola
  • Municípios de Talamanca e Changuinola (~33.000 habitantes)
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
ODS 2 - Fome zero
ODS 6 - Água potável e saneamento
ODS 13 - Ação climática
ODS 15 - Vida na terra
História
IUCN
Jeimy Carranza, ACBTC e produtora da comunidade BriBri (CR). Milton Hernández, agricultor da comunidade de Yorkín (CR). Miriam Morales, produtora da comunidade de Yorkín (CR)
IUCN

As comunidades indígenas e mestiças da bacia do rio Sixaola dependem muito da agricultura de subsistência (grãos básicos) e do cultivo de cacau, banana e banana-da-terra. Entretanto, a variabilidade climática está afetando a produção, devido a eventos extremos e à maior incidência de pragas e doenças nas plantações, além de mudanças no fluxo do Rio Sixaola. Durante as secas, a bacia média se torna intransitável, dificultando a comercialização de produtos, enquanto que, com chuvas extremas, as altas quantidades de sedimentos tornam a navegação perigosa e diminuem a qualidade da água. Isso, combinado com práticas agrícolas ruins, tornou necessária a introdução de medidas de EBA nas fazendas e margens dos rios para reduzir a erosão, restaurar as florestas ribeirinhas e diversificar a produção, aumentando assim a resiliência dos agroecossistemas e a segurança alimentar. As comunidades valorizam o conhecimento tradicional e queriam promover o uso de espécies nativas, adaptadas às condições locais, de modo que todas as medidas de EbA implementadas utilizassem espécies nativas e/ou sementes autóctones.

Jeimy Carranza (BriBri): "No contexto da mudança climática, a questão da conservação de sementes nativas, fazendas integrais e agricultura familiar é muito importante. É uma questão que há muito tempo vem demonstrando que tem impactos positivos sobre o meio ambiente. ...... As fazendas integrais e a agricultura familiar são formas de restaurar a paisagem. Portanto, quanto mais iniciativas como essas tivermos na bacia binacional, [mais] as comunidades terão mais capacidade de se recuperar ou de resistir aos eventos negativos da mudança climática."

Milton Hernández (Yorkin): "Agora estou vendo o que é realmente importante, que isso me levou a fazer uma mudança em mim, pessoalmente. Agora chego à minha fazenda, que beleza! Eu mesmo vejo isso. Eu tenho isso, eu tenho o outro, eu tenho o outro, eu tenho ... Antes eu não tinha isso. E nós temos terra para fazer uma fazenda muito boa. Agora estamos vendo isso. E estou muito feliz com isso".

Miriam Morales (Yorkin): "Para nós, a Feira é muito importante porque, dessa forma, podemos coletar sementes; e as sementes são daqui, da região, e às vezes não cultivamos e elas se perdem, então, dessa forma, podemos resgatar as sementes perdidas... É uma forma de também compartilhar com outros produtores e compartilhar sementes, porque isso também faz parte da nossa cultura. Quando temos sementes, estamos sempre trocando-as... "

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