
Criação e planejamento da Reserva Indígena Yaigojé Apaporis e do Parque Nacional Natural a partir de uma cosmovisão indígena

Sete povos indígenas compõem a Reserva Indígena Yaigojé Apaporis em uma área de grande diversidade cultural na Amazônia colombiana. Devido ao fato de as atividades de mineração colocarem em risco seu complexo de locais sagrados, as autoridades tradicionais indígenas solicitaram aos Parques Nacionais Naturais da Colômbia (PNNC) a criação de uma área protegida sobreposta à Reserva. Nesse contexto, a Fundação GAIA Amazonas desenvolveu uma metodologia para que as próprias comunidades indígenas gerenciassem a criação, o planejamento e o zoneamento da Reserva Indígena e do Parque Nacional Natural Yaigojé Apaporis.
Contexto
Desafios enfrentados
Os sete povos indígenas que compõem a área de Yaigojé Apaporis formam um grupo cultural unificado que compartilha vários elementos, como os rituais tradicionais realizados em um complexo de locais sagrados. No entanto, a pressão externa das operações de mineração em seu território indígena ameaça seus locais sagrados, seu ambiente natural e sua cultura. Vendo suas limitações para enfrentar essas ameaças, as comunidades reconheceram a necessidade de pedir o apoio do PNNC para proteger seu território por meio da criação de uma Área Nacional Protegida, que é uma estrutura legal que garante a exclusão de atividades de desenvolvimento do setor, no caso específico delas: operações de mineração. Essa iniciativa apresentou vários desafios. Entre eles, conseguir manter seus valores culturais e a cosmovisão indígena, promover o uso do conhecimento xamânico tradicional de suas comunidades nos processos de planejamento e zoneamento e criar mecanismos de participação e diálogo local.
Localização
Processar
Resumo do processo
A criação da área protegida por solicitação indígena e com o apoio do Governo Nacional foi realizada no contexto de um processo de consulta prévia livre e informada e do estabelecimento de acordos especiais de gestão entre o Governo e as autoridades indígenas para a governança da área. Dois fatores importantes garantiram que o processo de planejamento fosse baseado na cosmovisão indígena. Primeiro, a existência do Regime Especial de Gestão (REM), que é uma estrutura legal que mantém a inalienabilidade dos territórios indígenas quando eles são categorizados como um Parque Nacional Natural. Segundo, o reconhecimento formal de seus valores culturais nos objetivos de criação do Parque. Para isso, a Fundação GAIA Amazonas liderou o desenvolvimento de uma metodologia apropriada e adequada que se tornou um insumo fundamental para que as organizações indígenas (como autoridades públicas), juntamente com o PNNC (como autoridade ambiental), definissem as diretrizes e construíssem o REM de acordo com as características culturais e ambientais da Reserva Yaigojé Apaporis.
Blocos de construção
Organização social local e apoio governamental nacional para a criação da área protegida
A Reserva Indígena Yaigojé Apaporis foi criada em 1998 por meio de uma solicitação dos povos indígenas Tanimuca, Yucana, Letuama, Matapí, Cabayari, Macuna, Barazano e Yujup-Macú. Em 2008, por meio de um consenso em uma sessão extraordinária das Autoridades Tradicionais e dos Capitães Indígenas (ATCI), essas comunidades decidiram solicitar a criação de um Parque Nacional sobreposto aos limites da Reserva. A solicitação foi baseada na consideração de que isso eliminaria o desenvolvimento de operações de mineração e outras explorações de recursos naturais que poderiam colocar em risco a biodiversidade, seus locais sagrados e, consequentemente, seus costumes, composição social e contexto ambiental.
A criação da Reserva Indígena Yaigojé Apaporis e do Parque Nacional Natural tem um longo processo de trabalho com a Fundação GAIA Amazonas, que contou com o apoio técnico e financeiro da Fundação Gordon & Betty Moore. A decisão de passar para um Regime Especial de Manejo (REM) precisava ter total apoio local, garantir a autonomia das comunidades indígenas e fortalecer seus sistemas tradicionais. Além disso, era necessário que elas tivessem habilidades de negociação e coordenação para estabelecer um acordo com o Estado.
Fatores facilitadores
- Comunidades indígenas tradicionais capacitadas em suas tomadas de decisão.
- A estrutura jurídica da Colômbia reconhece a autonomia indígena e seu papel como autoridades públicas e ambientais em seus territórios.
- Disponibilidade de recursos financeiros do Estado e de organizações estrangeiras para implementar um processo eficaz de consulta prévia informada.
- Experiência bem-sucedida de relacionamento entre o PNNC, as autoridades indígenas e a sociedade civil para fortalecer a governança ambiental territorial.
Lição aprendida
Uma vez tomada a decisão de criar o parque, o passo seguinte foi o acordo entre os Parques Nacionais Naturais da Colômbia (PNNC) e a Associação de Capitães Indígenas Yaigojé Apaporis (ACIYA) para realizar um processo de consulta livre, informada e prévia que permitisse maior participação social e construção coletiva em termos de definição de limites, extensão da área, objetivos de conservação e construção conjunta do REM. Como resultado, o ATCI estabeleceu acordos de gestão entre o Estado e as Autoridades Indígenas, estabelecendo que a gestão integrada da área seria baseada nos conhecimentos e regulamentos tradicionais recebidos de acordo com a forma de conceber o mundo de cada um dos sete povos indígenas e suas 19 comunidades, respeitando a autonomia indígena, seus direitos sobre suas terras comunais, seus locais sagrados e seus valores culturais. Assim, em outubro de 2009, foi declarada a constituição do Parque Natural Yaigojé Apaporis.
Planejamento da gestão da Reserva Indígena Yaigojé Apaporis e do Parque Nacional Natural a partir de uma cosmovisão indígena
A criação da Reserva Indígena e Parque Nacional Natural Yaigojé Apaporis marcou o início de um novo modelo de relacionamento entre os povos indígenas e o governo colombiano. Era necessário buscar mecanismos para garantir a governança e a conservação integral de seus sistemas de vida, sem interferir em seus direitos à autonomia territorial e à gestão cultural que tradicionalmente realizavam. Uma vez criado o parque, foi iniciado o processo de formulação de seu Regime Especial de Manejo (REM). Esse regime foi o instrumento por meio do qual a administração conjunta do parque foi compartilhada entre os Parques Nacionais Naturais da Colômbia (PNNC) e a Associação de Capitães Indígenas Yaigojé Apaporis (ACIYA). O estabelecimento do REM exigiu uma metodologia de pesquisa interna (ou endógena), proposta pelas comunidades indígenas e apoiada pela experiência da Fundação GAIA Amazonas. Essa metodologia foi baseada nas diretrizes emitidas por um Congresso Indígena Amazônico que identificou os tópicos a serem coletados em cada uma das comunidades, a fim de orientar o projeto do REM. Essa abordagem ajudou a promover a participação das comunidades indígenas com três representantes e um xamã.
Fatores facilitadores
- Figura jurídica do REM que mantém a inalienabilidade dos territórios indígenas quando estes adquirem a categoria de Parque Nacional.
- Desenvolvimento de uma metodologia interna, liderada pela Fundação GAIA Amazonas em conjunto com as organizações indígenas, para estabelecer as diretrizes do REM de acordo com as particularidades do Parque e o regime de gestão.
- Disponibilidade financeira de recursos do Estado e apoio externo para implementar um processo participativo de construção do REM.
Lição aprendida
O processo de pesquisa para desenvolver o REM foi realizado em dois anos. O Acordo de Cooperação 011 de 2013 celebrado entre o PNNC e a ACIYA estabeleceu um prazo razoável de cinco anos para a construção, formalização e implementação conjunta do REM. Esse processo permitiu o seguinte:
- Resgatar valores ancestrais.
- Promover maior envolvimento dos jovens no projeto do REM.
- Revalorizar o conhecimento tradicional.
- Gerar uma maior relação de coordenação e gestão da área entre a equipe do PPNC e as populações indígenas.
- Gerar uma melhor compreensão das características biológicas do território e de seu valor cultural, como um insumo para a elaboração das estratégias de gestão do Parque.
- Tornar-se um modelo replicável para outras REMs na Amazônia colombiana, uma vez que permite a integração do conhecimento tradicional sobre o uso de recursos naturais com as políticas do PNNA relativas à gestão de áreas protegidas.
Impactos
- O processo de criação da área protegida e o desenho de seu Regime Especial de Manejo (REM) foram baseados nos princípios de participação social e construção coletiva entre o PNNC, as autoridades indígenas e os capitães da reserva Yaigojé Apaporis.
- A função pública de conservação e gestão ambiental na área foi coordenada, com base nos sistemas culturais de regulação e gestão do território dos povos indígenas.
- Por meio de um processo de consulta prévia, livre e informada, foram estabelecidos acordos entre o governo e as autoridades indígenas para que a gestão da área se baseie no conhecimento tradicional e respeite sua autonomia e seus direitos sobre suas terras comunais, seus locais sagrados e valores culturais.
- Por meio da criação do Parque Nacional, a Associação de Capitães Indígenas Yaigojé Apaporis (ACIYA) protegeu mais de um milhão de hectares de floresta tropical e acordou com o governo um modelo de gestão ambiental baseado em seus conhecimentos tradicionais.
- A aplicação de uma metodologia de pesquisa endógena no projeto do REM possibilitou o resgate de valores ancestrais, estimulou a participação de jovens, aumentou a conexão entre a equipe do PNNC e os povos indígenas e a compreensão dos valores biológicos e culturais da área para gerar estratégias de gestão.
Beneficiários
Os sete principais povos indígenas da área pertencem aos grupos Macuna, Tanimuka, Letuama, Cabiyarí, Yauna, Barazano e Yujup Macú, e têm uma população aproximada de 1.536 pessoas distribuídas em 19 comunidades.
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
História

"O GAIA trabalha com os povos indígenas da Amazônia há 25 ou 30 anos e, entre eles, com os habitantes da Reserva Indígena do Apaporis. Nossa primeira aposta, na década de 1980, foi obter o reconhecimento legal como reserva indígena. Depois disso, passamos a fortalecer os sistemas organizacionais e governamentais, o que ajudou a descentralizar a prestação de serviços básicos, como educação e saúde, sempre sob o ponto de vista cultural, ambiental e territorial.
Quando a ameaça da mineração foi identificada em 2007-2008, para pedidos de títulos de mineração por uma empresa canadense, começamos a trabalhar com a população indígena para criar estratégias conjuntas para a conservação de seu território. Percebeu-se que a criação de um parque natural não apenas protegeria seu território e subsolo, mas um exercício de coordenação com os Parques Nacionais Naturais da Colômbia fortaleceria os sistemas de gestão existentes nesses territórios. Esse último objetivo foi alcançado por meio do reconhecimento dos povos indígenas como Autoridade Ambiental. Mas, além de trabalhar na proteção legal do território, também fortalecemos os processos de pesquisa local ou endógena. Isso mostra claramente uma articulação entre os jovens líderes e o conhecimento tradicional dos povos indígenas que habitam esse território.
É importante ressaltar que não se trata apenas de uma aposta na criação de um parque nacional, mas também no contexto de um macroterritório biocultural onde encontramos complementaridades com outras organizações e comunidades indígenas com as quais trabalhamos na gestão integral de seu território. Por esse motivo, procuramos encontrar complementaridades do ponto de vista ambiental, ecossistêmico e cultural nos territórios em que trabalhamos.
Por fim, é importante enfatizar que nosso trabalho se traduz em um exercício bem-sucedido de relacionamento e coordenação entre os povos indígenas reconhecidos como Autoridade Ambiental, Parques Nacionais da Colômbia e o acompanhamento de uma ONG que persistiu e foi constante ao longo dos anos, e construiu uma forte confiança com os povos indígenas e com as autoridades governamentais. Isso nos permitiu alcançar um nível de articulação e complementaridade com o ponto de vista cultural do território, de modo que ele desembarque em instrumentos de planejamento e gestão adequados à cultura ocidental, proporcionando um acompanhamento harmonioso e construtivo."